sexta-feira, abril 06, 2007

Poesia contemporânea

Como os robots que tenho fechados na cave declararam greve tenho de ser eu mesmo a escrever este post, logo a comicidade vai ser muito maior do que o habitual.

Estava eu a ver os meus ficheiros recebidos à procura de fotos pornográficas e deparo-me com este som, uma verdadeira pérola:



Para os ouvintes mais desatentos a música do Cenoira é apenas genial, mas uma análise mais cuidada revela mensagens subliminares de luxo.

"E ponho o rec pra gravar esta cena,
já tá ligado,
já tá a gravar.."


O Cenoiras entra confiante, com um ímpeto inicial que nos deixa abalados, deixando o instrumental correr apenas 1 segundo antes de começar logo a debitar rimas.

Começa o poema com a conjunção "E" que alerta logo para o facto de estar a fazer algo enquanto está a cantar, deixando a imaginação do ouvinte falar "Estou a cozinhar um polvo à lagareiro E PONHO O REC PRA GRAVAR ESTA CENA", por exemplo. Continuando..

"eu decaminho por DCC vou mandar,
a toda a gera da net pa me ouvirem.."


Uma alusão surpreendente às novas tecnologias aliada à reputação old school do IRC (DCC é o mesmo que send file) é um dos muitos paradoxos deste poema, o passado, o presente e o futuro.. um liricismo intemporal.

A segunda frase contém um erro gramatical, pois "gera da net" é 3º pessoa singular e o Cenoiras conjuga o verbo ouvir na 3º pessoa do plural.
Agora REPAREM NA MENSAGEM SUBLIME que ele quer mandar com este erro intencional, a defesa da pluridade, um apelo anti-racista através duma visão plural e heterogénea que procura aceitar as diferenças.

"o ezko sou eu,
eu sou o cenoira,
gosto do meu cabelo mas sou loiro!
e vocês enganaram-se todos isto não rima,
mas tá-me a sair bem nao sei porquê.."


Aqui temos pano para mangas..

Ao bom estilo de Fernando Pessoa, o Cenoira revela uma multiplicidade de "eu's", ora é o Ezko, ora é o Cenoira.

Depois, um pouco de humor, enganando os ouvintes que esperavam ouvir "loirA", ele faz uma finta com o seu vasto arsenal léxico.

Nesta parte do poema, o Cenoiras começa a revelar alguma arrogância, dizendo que estamos todos enganados e realça o seu skill natural, as coisas saiem-lhe bem sem ele saber como.

"e vocês vão todos com o caralho,
ide c'o caralho que eu sou de gervide,
sou de quebrantões,
ide todos coçar os kilhões, pra casa!"

O tom arrogante ganha uma nova dimensão aqui, e o Cenoira diz-nos com orgulho que é de Gervide, mas depois confunde-nos novamente, dizendo que é de Quebrantões, uma alusão genial ao facto de ser omnipresente. Ainda nos especifica o sítio para o qual os devemos ir coçar.. para casa!

"e vem aí a minha mae,
dá-me mais,
salada de fruta e iogurtes da longavida,
e ela é fixe porque não tem a sida!"


A referência à mãe é um tema clássico na poesia, e o Cenoira nao deixa o seu crédito por mãos alheias e vai buscar a figura da mãe. Nem quero imaginar os milhoes de euros que a Longavida pagou para o seu nome figurar numa música de Cenoira..

A última frase é uma mensagem de incentivo ao uso dos contraceptivos para evitar doenças infecto-contagiosas, o autor apesar de mostrar um afecto pelo liricismo clássico preocupa-se com os grandes problemas da actualidade e diz-nos que a mae é fixe porque nao tem a sida. O uso do artigo definido "a" é um pormenor de luxo, podendo parecer inútil à vista desarmada, embeleza em muito a frase.

"e vai-me dar um chapadão na testa,
e vamos todos pra casa..
fazer festa,
fazer festa (risos).."


Retoma aqui o tom agressivo e até nos presenteia com um riso lascivo, todos sabemos o que fazer festa significa..

"isto deve tar a acabar,
espera aí um bocado,
espera aí um bocado q isto deve tar a acabar,
e eu decaminho comer vou manjar,
vou manjar essa merda toda sem parar,
e eu vou parar..
agora q vai acabar,
e já vai em 56 segundos e eu já tou cansado,
o beat acabou agora mesmo e nao rim.."


É nesta altura que recebemos uma má notícia, somos informados que a música está quase no seu fim, mas em compensação há uma maior interacção, fazendo quase parecer um diálogo, "espera ai um bocado, espera ai um bocado".

Segue-se um conjunto de rimas brilhantes acabadas em "ar", quase como um viciante jogo de sons e ritmos.

Por fim, dá-nos com exactidão o tempo que já cantou e é aí que acordamos, "56 segundos?? isto estava a ser tão espectacular que pareceu apenas 1 segundo". Acaba em beleza nao terminando a palavra, ao estilo das séries que acabam os episódios com o famoso "to be continued"..

Vou usar esta música como ambiente de fundo da publicidade da Arrumocar, podem crer.